Protocolo de Morte Encefálica (M.E)

A perda completa e irreversível das funções encefálicas, definida pela cessação das atividades corticais e de tronco encefálico, caracteriza a morte encefálica e, portanto, a morte da pessoa. (Resol. CFM 2173/2017)

O diagnóstico de ME é obrigatório e a notificação compulsória para a Central de Notificação, Captação e distribuição de órgãos (CNCDO), independente da possibilidade de doação ou não de órgãos e/ou tecidos. (Lei 9434/1997)

Quais casos monitorar possível evolução para ME?

Pacientes internados em UTI, em ventilação mecânica, com diagnóstico de:

  • AVC hemorrágico ou isquêmico;
  • TCE;
  • outras situações que possam determinar HIC.

O paciente deve estar há pelo menos 6 horas em observação hospitalar, exceto nos casos de diagnóstico de ME por encefalopatia hipóxico-anóxica, em que deve estar em observação há pelo menos 24 horas.

Outras causas para ME

  • Infecções do sistema nervoso central;
  • Tumores do sistema nervoso central;
  • Encefalopatia hipóxico/anóxica após PCR

Doenças que podem confundir com o ME

Algumas doenças possuem “mímicas” de morte encefálica, mas não o são. Assim, é importante estar atento se esse é o caso do seu paciente:

  • Bloqueio neuromuscular:
    • Síndrome de Guillain-Barré (de evolução desfavorável);
    • Botulismo;
  • Hipotermia
  • Intoxicação por drogas:
    • Tricíclicos;
    • Lidocaína;
    • Sedativos, incluindo barbitúricos;
    • Ácido volproico;
    • Bupropiona.
  • Lesão de coluna/medula alta;
  • Síndrome de Locked-in (paciente somente tem movimento ocular preservado).

Abrindo o Protocolo

1ª etapa: critérios para abertura, premissas ou pré-teste

Antes de iniciar o protocolo de morte encefálica, o médico confirma se não há fatores que impactam na condição clínica do paciente.

Caso tenha alguma situação excludente, o protocolo não é iniciado.

Os procedimentos para diagnosticar a morte encefálica só devem ser realizados em indivíduos que estejam em coma não perceptivo, ausência de reatividade supraespinhal e apneia persistente.

Além disso, cabe lembrar que o quadro clínico precisa cumprir os seguintes pré-requisitos:

  • presença de lesão encefálica de causa conhecida e irreversível;
  • ausência de fatores tratáveis que confundiriam o diagnóstico;
  • temperatura corporal superior a 35ºC;
  • saturação arterial de acordo com critérios estabelecidos na tabela da Resolução CFM nº 2173;
  • tratamento e observação no hospital, pelo período mínimo de seis horas;
  • em caso de encefalopatia hipóxico-isquêmica, essa observação se estende por um período mínimo de 24 horas.

Encefalopatia hipóxico-isquêmica é uma síndrome causada pela redução na oxigenação do sangue, combinada à elevação de dióxido de carbono (asfixia) e isquemia — esta sendo uma diminuição do fluxo sanguíneo que, em geral, é causada por bloqueios em artérias e veias.

Para que a morte encefálica seja confirmada, é preciso realizar dois exames clínicos, um teste de apneia e um exame complementar comprobatório.

Durante os procedimentos, o paciente fica conectado a aparelhos de ventilação mecânica, que o manterão respirando até a confirmação da morte encefálica.

2ª etapa: nível de consciência (Escala de coma de Glasgow)

Cumpridos os pré-requisitos, o primeiro teste do protocolo de morte encefálica pode ser iniciado.

Esse procedimento tem como objetivo avaliar o nível de consciência do paciente — ou seja, o grau de alerta comportamental que o indivíduo apresenta.

Medi-lo pode ser bastante complexo, pois depende das respostas do paciente e de como são avaliadas.

Atualmente, existem escalas criadas para padronizar os diferentes níveis de consciência, e uma das mais aceitas é a escala de coma de Glasgow.

Essa escala permite uma avaliação rápida e de fácil compreensão, sendo amplamente utilizada em casos graves e traumatismos.

A ferramenta considera três testes:

  • abertura ocular;
  • capacidade verba;
  • capacidade motora.

Eles atribuem pontos de acordo com a resposta do paciente. Uma pontuação abaixo de 8 indica estado de coma.

Para confirmação de morte encefálica, o score deve ser o mais baixo possível: 3.

Isso significa que o paciente está em coma não perceptivo, ou seja, não abre os olhos, não consegue falar e não se movimenta.

3ª etapa: exame clínico neurológico e reflexos

Depois de confirmado o coma não perceptivo, o médico testa os reflexos do tronco encefálico do paciente. São verificados:

  • reflexos pupilar (resposta à luz);
  • córneo-palpebral (ausência de fechamento das pálpebras ao toque da córnea);
  • óculo-cefálico;
  • vestíbulo-ocular;
  • tosse.

O reflexo óculo-cefálico consiste em girar a cabeça para ambos os lados, mantendo os olhos do paciente abertos, para observar se eles se movimentam dentro da órbita.

Já o reflexo vestíbulo-ocular serve para certificar a ausência de movimento dos olhos, irrigando cada ouvido com líquido gelado.

Por fim, no teste de tosse, caso não ocorra reação, náusea, sucção, movimentação facial ou deglutição, o paciente vai para o teste de apneia.

4º etapa: teste de apneia

O teste de apneia é uma das etapas durante a realização do protocolo de morte encefálica

É um dos últimos recursos, realizado quando o indivíduo não respondeu aos demais testes.

Esse procedimento serve para verificar se há qualquer movimento respiratório do paciente, que é desconectado do aparelho de ventilação mecânica e recebe estímulo com oxigênio.

Nesse sentido, as atenções serão voltadas para os movimentos de expiração e inspiração voluntária, observando a elevação da caixa torácica, sem ajuda dos equipamentos de ventilação mecânica.

Se o paciente permanecer muito tempo sem apresentar esses movimentos, na denominação de apneia, pode-se constatar a morte encefálica.

5º etapa: exame complementar confirmatório

Além dos testes clínicos, a legislação brasileira exige pelo menos um exame diagnóstico complementar para atestar a morte encefálica.

Esse procedimento precisa confirmar ausência de atividade elétrica, metabólica ou de perfusão (fluxo) sanguínea do encéfalo.

Eletroencefalograma (EEG), arteriografia e doppler transcraniano são comumente utilizados para constatar a morte encefálica.

Outros exames também podem ser solicitados pelo médico, considerando a situação clínica e os equipamentos médicos disponíveis na unidade de saúde.

6ª etapa: segundo exame neurológico e reflexos (feito por outro especialista)

Por último, um segundo especialista testa novamente os estímulos do paciente.

Esse procedimento é feito por um profissional capacitado para diagnosticar a morte encefálica e deve obedecer aos intervalos especificados na Resolução CFM nº 2173.

Para crianças com idade entre sete dias e dois meses incompletos, o intervalo mínimo é de 24 horas. De dois a 24 meses incompletos, de 12 horas. Acima de dois anos, de uma hora.

Eletroencefalograma na morte cerebral

O EEG é o exame mais utilizado para confirmar a ausência de atividade elétrica no cérebro, no Brasil e no mundo, como protocolo de morte encefálica.

Ele é relativamente simples, não invasivo e tem alta sensibilidade, mostrando a inatividade em pacientes com morte cerebral.

Para o diagnóstico de morte encefálica, recomenda-se que o teste seja feito com oito derivações.

Cada derivação representa uma linha no traçado do eletroencefalograma, correspondendo ao registro — ou não — de estímulos elétricos.

Quando o paciente está em morte encefálica, não há presença dos estímulos necessários ao funcionamento do cérebro.

Passos para finalizar o protocolo de morte encefálica

Após realizar todos os procedimentos necessários para confirmação da morte encefálica é preciso continuar os tramites para liberação dos órgãos em caso de doação ou do corpo para o sepultamento.

Nesse sentido, o primeiro passo é comunicar o resultado ao médico assistente, apontando os desfechos do testes, as condições de realização e a presença de outros especialistas em casos mais complexos.

Os formulários sobre a morte encefálica devem conter:

  • os dados mensurados;
  • o horário e o tipo de cada teste realizado;
  • os profissionais que os executaram;
  • se houve uso de medicamentos para manter a perfusão sanguínea;
  • se ocorreu uso prévio de antibacterianos; entre outras informações.

Assim que os procedimentos médicos estiverem completos, o próximo passo é avisar a família.

Com isso, pode-se dar início aos trâmites sobre a doação de órgãos ou à comunicação aos demais interessados para que obtenha a declaração de óbito.

Se a família optar pela doação, o processo envolverá a retirada de cada órgão ainda no ambiente hospitalar. Caso contrário, os procedimentos serão realizados pelo necrotério e funerária.

Ressalta-se que a doação de órgãos deve ser sempre incentivada, visto a grande fila de espera por transplantes que podem resgatar o estado de saúde de pacientes debilitados clinicamente.

No entanto, o respeito pela decisão da família ou ausência de informações do doente que veio a óbito pode ser um complicador, principalmente nesse momento de dor e sofrimento familiar.

Referências:

  1. AZEVEDO, Luciano César Pontes de; TANIGUCHI, Leandro Utino; LADEIRA, José Paulo; MARTINS, Herlon Saraiva; VELASCO, Irineu Tadeu. Medicina intensiva: abordagem prática. [S.l: s.n.], 2018.
  2. Associação Brasileira de Transplantes de órgãos. Disponível em: < https://bit.ly/3ANw1BM >.
  3. Legislação de transplantes de órgãos. Disponível em: < http://www.saude.ba.gov.br/transplantes/legislacao-sobre-transplantes/ >.
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