Broncoaspiração: O que é?

A broncoaspiração consiste na entrada de substâncias estranhas nas vias aéreas inferiores. No perioperatório, pode haver a aspiração imprópria de conteúdo gástrico ou da orofaringe.

Já em emergências, atendem-se casos de aspirações que, além das já citadas, podem incluir partículas sólidas, ou também chamada de aspiração de corpo estranho.

As possíveis consequências incluem pneumonite, pneumonia e atelectasia. Para o correto manejo é de suma importância para o médico assistente fazer sua correta distinção.

Quais são as causas?

A broncoaspiração consiste no quinto evento adverso mais comum durante a anestesia geral.

Segundo J. D’Haese et al., cerca de 20% dos pacientes apresentam microaspirações enquanto estão intubados. Após ensaio utilizando corante na cavidade oral associado à intubação, conforme técnica padronizada, 1/5 dos pacientes apresentou coloração na traquéia em porção inferior ao balonete, demonstrando aspiração.

Os motivos principais são o vazamento aéreo do balonete ou mesmo o seu enchimento incompleto, ambos ocasionando espaço entre a via aérea e o tubo, gerando passagem de secreções ou gotículas.

Os Fatores de Risco

Algumas situações ou condições clínicas comprometem a proteção fisiológica das vias aéreas inferiores, alterando principalmente o correto fechamento glótico e o reflexo da tosse, dentre elas:

  • Consciência reduzida;
  • Distúrbios de deglutição / déficit neurológico;
  • Doença do refluxo gastroesofágico;
  • Lesão mecânica na glote ou no esfíncter esofágico inferior devido à traqueostomia, intubação endotraqueal, broncoscopia, endoscopia digestiva alta ou alimentação por sonda nasogástrica;
  • Cirurgia que envolva a via aérea ou esôfago superior;
  • Ausência de jejum adequado no processo de anestesia geral;
  • Anestesia utilizando máscara laríngea;
  • Outros: Gestantes; obesos; íleo adinâmico.

Um importante fator protetor que possuímos contra a regurgitação é a competência do esfíncter esofágico inferior, o qual pode suportar uma pressão intragástrica de até 20 cm de H₂O no seu estado normal. Na falha deste mecanismo, o vômito pode ocorrer favorecendo a broncoaspiração.

Como é diagnosticado?

Sugerem a ocorrência de broncoaspiração:

  • Visualização de conteúdo gástrico na orofaringe durante o processo de intubação orotraqueal;
  • Hipoxemia durante a ventilação mecânica, apesar do correto posicionamento do tubo;
  • Aumento da pressão inspiratória durante a anestesia geral;
  • Dispneia, broncoespasmo e hiperventilação no pós-operatório.

O Manejo

Na ocorrência de broncoaspiração durante a laringoscopia, após a indução anestésica, deve-se posicionar o paciente imediatamente em posição Trendelemburg, aspirar sua orofaringe, realizar a intubação orotraqueal e aspirar a luz do tubo endotraqueal.

A lavagem do tubo com solução fisiológica 0,9% não é preconizada, visto que a lesão pulmonar ocorre em segundos após a aspiração, havendo ainda o risco de dispersão do conteúdo gástrico para regiões mais periféricas do pulmão.

As Complicações

As principais complicações ocasionadas pela broncoaspiração incluem: pneumonite, pneumonia e atelectasia.

Pneumonite

Refere-se à aspiração das substâncias que são tóxicas para as vias respiratórias inferiores, independentemente da infecção bacteriana.

Uma pneumonite química pode instalar-se nos casos em que o pH for menor do que 2,5, evoluindo com processo inflamatório 4h após a aspiração. A presença de atelectasias e broncoespasmo não é infrequente.

A broncoaspiração também cursa com aumento da permeabilidade capilar pulmonar e diminuição da complacência exigindo suporte ventilatório com pressão positiva. Estudos subsequentes mostraram que esta forma de aspiração geralmente segue um curso mais fulminante, pois a lesão pulmonar por aspiração de conteúdo gástrico ocorre em  egundos, e que pode resultar na síndrome de angústia respiratória aguda (SARA).

Nesses casos, a gasometria arterial geralmente mostra que a pressão parcial de oxigênio é reduzida, acompanhada por uma pressão parcial normal ou baixa de CO2, com alcalose respiratória. Dentro de três minutos, ocorre atelectasia, hemorragia peribrônquica, edema pulmonar, e a degeneração das células epiteliais brônquicas.

Em quatro horas, os espaços alveolares são preenchidos por leucócitos polimorfonucleares e fibrina. Membranas hialinas são vistas dentro de 48 horas. O pulmão neste momento torna-se edemaciado, com focos hemorrágicos e com consolidações alveolares.

Todos os resultados acima descritos também foram observados na autópsia de pacientes com pneumonite fatal. O mecanismo presumido é a liberação de citocinas pró-inflamatórias, fator de necrose tumoral-alfa (TNF-a) e interleucina (IL). As seguintes características clínicas devem levantar a possibilidade de pneumonite química:

Início abrupto dos sintomas com dispnéia em destaque; febre, que é geralmente baixa; cianose; crepitantes difusos na ausculta pulmonar; hipoxemia grave e infiltrados na radiografia do tórax nos segmentos pulmonares envolvidos.

Os lobos envolvidos em posição ortostática são os inferiores. No entanto, a aspiração que ocorre quando os pacientes estão em posição de decúbito dorsal acomete os segmentos superiores dos lobos inferiores e os segmentos posteriores dos lobos superiores.

Pneumonia por aspiração

Cerca de 20-30% dos pacientes que apresentarem episódio de broncoaspiração irão desenvolver pneumonia. A pneumonia de aspiração refere-se às consequências pulmonares resultantes da entrada anormal de líquidos, substâncias exógenas, partículas, ou secreções endógenas para as vias aéreas inferiores e aspiração de microorganismos da cavidade oral ou da nasofaringe.

A maioria dos pacientes apresenta manifestações comuns de pneumonia, incluindo tosse, febre, expectoração purulenta e dispneia, mas o processo se desenvolve ao longo de um período de vários dias ou semanas. Muitos pacientes apresentam emagrecimento e anemia como características comuns de um processo mais crônico.

Diferentemente da pneumonia comum, a pneumonia por aspiração é causada por bactérias presentes na flora do TGI, sendo, portanto, menos virulentas. A maioria dos casos envolvem bactérias anaeróbias e estreptococos aeróbio ou microaerófilos que normalmente residem nas fendas gengivais.

Existe uma associação com a doença periodontal, e esta complicação é menos comum em pacientes com boa higiene dental e aqueles que não apresentam dentição. A microaspiração oriunda de secreção das vias aéreas superiores, devido ao vazamento do balonete do tubo endotraqueal, tem sido reconhecida como a principal causa de pneumonia pós-intubação.

Atelectasia

É a perda de volume ou ausência de ar no pulmão. A etiologia com desfecho mais grave é a aspiração de corpo estranho, que é mais comum em crianças. Os sintomas são dor torácica, tosse e dispneia. O diagnóstico é confirmado no raio-x de tórax. Nesse caso, deverá ser realizada broncoscopia flexível com a finalidade de retirar o corpo estranho, com brevidade.

Referências:

  1. Cavalcanti IL, et al. Tópicos de Anestesia e Dor. In: Monteiro BF. Broncoaspiração. Rio de Janeiro:Saerj; 2011. p. 345-51.
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  3. D’Haese J, DE Keukeleire T, Remory I, et al. Assessment of Intraoperative Microaspiration: does a modified cuff shape improve sealing? Acta Anaesthesiol Scand. 2013 Aug;57(7):873-80.
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Blue Dye Test: Teste de Deglutição

Você sabia que o Fonoaudiólogo faz um papel importante na avaliação de função de deglutição em pacientes traqueostomizados?

É feito o que chamamos de “Blue Dye Test”, onde consiste no uso do corante azul alimentício, para avaliar deglutição, presença de fístulas traqueoesofágicas, risco de broncoaspiração de saliva em pacientes traqueostomizados de permanência maior.

Para que o paciente seja liberado a voltar a comer por via oral, o fono faz este tipo de teste para que tenha condições de serem liberadas as dietas especiais.

Como é feito este teste?

O Teste do Corante Azul ( Blue Dye Test), consiste em aplicar 4 gotas de corante culinário azul (anilina) na cavidade oral do paciente em 4/4 horas por 2 dias consecutivos para analisar a deglutição, verificando a presença ou não de aspiração traqueal.

O paciente deverá deglutir após aplicação do corante e realizar aspiração endotraqueal imediata e ao longo do dia pela equipe multiprofissional (fonoaudiologia, enfermagem, fisioterapeuta).

Sendo resultados:

  • Blue Dye Test Positivo (+) presença de secreção corada de azul;
  • Blue Dye Test Negativa (-) ausência de secreção corada de azul.

Quando o blue dye test é positivado, é reavaliado posteriormente pelo fonoaudiólogo.

É importante sempre registrar em relatório os sinais positivos e negativos deste teste, dentro do período que foi realizado o mesmo.

Resultados Esperados

Diagnóstico funcional da deglutição: Presença ou ausência de disfagia orofaríngea e riscos de broncoaspiração do alimento. Discussão do caso com a equipe multidisciplinar e estabelecer conduta  fonoaudiológica (modificar dieta VO; suspender dieta VO; indicação de terapia fonoaudiológica).

*POST DEDICADO À MINHA COLEGA FONO CRISTINA *

Referências:

  1. DE ARAÚJO, VIVIANE CASTRO; SILVA, CRISTIANE RODRIGUES; DE SOUZA CUNHA, HELBERSON PEDRO; DA SILVA RORIZ, RAQUEL NASCIMENTO; LOPES, PAMELA PAOLA CARNEIRO. OCORRÊNCIA DE BRONCOASPIRAÇÃO DE SALIVA EM PACIENTES TRAQUEOSTOMIZADOS. OCORRÊNCIA DE BRONCOASPIRAÇÃO DE SALIVA EM PACIENTES TRAQUEOSTOMIZADOS, [S. l.], p. 9779, 25 jun. 2018. Disponível em: https://sbfa.org.br/portal/anais2017//trabalhos_select.php?id_artigo=9779&tt=SESS%C3%83O%20DE%20P%C3%94STERES. Acesso em: 9 jan. 2021.